06 abril 2014

Mais Encanto na Hora da Despedida


Se foi esta a última vez que o Rali de Portugal se disputou em terras algarvias (coisa que, em bom rigor, ninguém sabe com certeza absoluta), fê-lo com brilhantismo e, se foi esse o caso, tal como a Coimbra dos estudantes, teve mais encanto na hora da despedida.

Houve tudo o que se pode pedir numa prova automobilística disputada em pisos de terra: lama, piso escorregadios, emoção no topo da tabela classificativa e, para acabar bem, melhoria do estado do tempo à medida que se avançava para o final da prova, à hora de almoço de domingo.

Não faltaram despistes e peripécias, todos, felizmente, sem desastres pessoais: dois carros deslizaram por um barranco abaixo no fim do troço de Almodôvar sexta-feira à noite, obrigando bombeiros e organização a um trabalho insano à luz dos projetores. O checo Robert Kubika bateu forte no primeiro troço da manhã do dia seguinte e o estónio Ott Tanak que estava a fazer uma prove espetacular despistou-se no troço do Malhão (no preciso local onde Latvala "fora aos figos" em 2009 num dos sítios com mais gente a assistir), obrigando à neutralização do setor.

Nos portugueses Ricardo Moura confirmava que era o mais rápido (15º da geral) e o regressado Rui Madeira, navegado por Nuno Rodrigues da Silva, conseguia superar problemas elétricos e manter-se em prova.

Para ser perfeito este Vodafone Rally de Portugal, precisava de um banho de multidão como no Fafe WRC Rally Sprint há oito dias. Mas, quando se desloca a prova para o extremo sul do país, obrigando os espectadores de Coimbra para norte a terem de fazer uma ida e volta de mais de mil quilómetros não se podem esperar milagres.

E não é por os troços não serem bonitos nem mal desenhados. É por se desenrolarem longe de tudo, entre o extremo sul do Alentejo (Almodôvar) e a serra algarvia (Santana da Serra) ou seja naquilo que os geógrafos chamam o "deserto português".

O troço do Malhão, com os seus 22 km, a desenrolar-se entre montes e vales a norte de Messines e de Salir não fica a dever a Arganil nem a Fafe em espetacularidade. No gancho da Zona Espectáculo 21, perto de Várzea Redonda (a nordeste de São Marcos da Serra) vêm-se os carros a passar na cumeada a sul, ouvem-se descer para o vale e começar a subir, aprecia-se uma monumental atravessadela num gancho à direita (onde os pilotos dos carros menos potentes e de tração às duas lutam com brilhantismo para não perderem muito tempo) e ainda se podem ver os concorrentes fazer o início de uma subida sinuosa.

Ali, na tarde de sábado houve de tudo: a luta entre Ogier (VW) e Hirvonnen (Ford) pela primeira posição, um surpreendente jogo de equipa na Hyundai com um dos i20 a parar no gancho, depois de meio pião e marcha atrás, para dar a posição ao companheiro de formação e um concorrente dos mais atrasados que tanto balançou o carro para a esquerda ante do cotovelo à direita que ficou pendurado no barranco em equilíbrio instável e teve de ser empurrado pelos comissários...

Está lá tudo o que faz um bom rali menos... público. Para quem esteve em Fafe uma semana antes, era a diferença entre um jogo de futebol de salão num pavilhão e o Estádio da Luz cheio. Era o mesmo ambiente mas numa escala fractal de milésimas.

Lá estava numa encosta um pândego no meio da multidão a pôr música ao berros e a incitar os que estavam do outro lado da pista a bater palmas e a fazerem barulho. Um artista com uma motosserra a fazer barulho. Um outro que tinha microfone e amplificação e fazia o escrutínio de toda a gente que passava no carreiro: "Ó chefe não mije no pinheiro que pode vir o dono", "não empurrem a velha, malandros, deixem-na descer", "das cervejas que aí levas, tens que aqui deixar metade" e por aí fora.

A diferença é que, numa nesga em Fafe onde haveria cinco ou seis mil pessoas a comprimirem-se em cada milímetro quadrado disponível, aqui num ponto equivalente, se houvesse 500 ou 600 já era muito. A única vantagem para quem vem ver o Rali e sobretudo para quem vem trabalhar é que nunca há problemas de maior a estacionar perto do troço nem a sair...

Mas onde a diferença é abismal é no Parque Fechado e zona de equipas no Estádio do Algarve. Enquanto em Fafe se vai a pé do centro da cidade ver o arraial de carros e mecânicos, comer uma bifana e beber uma cerveja, no Estádio, até pelos excessos de zelo da GNR, um humilde espetador que só queria ver os seus ídolos mais de perto sente-se desmotivado e acaba por se ir embora, ou nem sequer lá vai por a zona fica numa terra de ninguém entre Faro e Loulé onde só se chega de carro (se a polícia deixar) ou depois de uma longa caminhada a partir da estação de comboio.

O Rali volta de vez ao Norte? Como sem público não há desporto, todos ficamos a aguardar.

Fonte: www.expresso.sapo.pt
por Rui Cardoso

1 comentário:

Alex - Chocapic disse...

Que eu saiba o Kubica "perdeu" a mão, não foi a nacionalidade Polaca.


Isto de se querer "escrever" sobre tudo...