Há
pouco tempo lia um artigo de opinião numa conhecida revista informativa em que
o seu autor declarava em tom depreciativo "hoje em dia, as coisas só se
medem em euros".
De facto, empurrados pela conjuntura
sócio-económica do nosso país, vivemos cada vez mais influenciados pelo valor
material das coisas. Fazem-se contas à vida: há que pagar impostos, créditos,
consumo. Há os subsídios disto e daquilo, dados de bandeja a uns, retirados
inconstitucionalmente a outros. Há a troika, o governo, os chefes de Estado
europeus e os media que nos enchem de informação sobre défices, juros da
dívida, bolsa de valores, austeridade e
crise financeira. Tudo se resume, basicamente, a Euros.
No entanto, há ainda algumas coisas
que nos fazem lembrar que nem tudo se resume a dinheiro e porque "o homem
cresce na adversidade", há gente que continua a ter como objectivo o bem
comum, independentemente dos euros que ganham (ou perdem) ao serem fieis a esse
objectivo. Com estas dificuldades que se fazem sentir e num país onde cada vez
mais o egocentrismo toma conta da sociedade, não por mera coincidência mas
porque as circunstâncias assim parecem exigir que aconteça, faz ainda mais
sentido reflectir sobre quem faz de si uma excepção à regra e decide pugnar por
algo que não o benefício próprio.
No concelho de Fafe existem várias
dezenas de associações recreativas, desportivas e culturais que são o espelho
deste espírito altruísta. Não querendo desfazer nenhuma outra, há duas que
gostava de mencionar - pela proximidade com as pessoas que dela fazem parte e
pelo trabalho que realizam - a ARCO (Associação Recreativa e Cultural de Santo
Ovídio) e a ADDAF (Associação de Defesa dos Direitos dos Animais e da Floresta)
são duas associações que contrariam toda esta obsessão (legítima, mas não deixa
de ser uma obsessão) pelos preciosos Euros. São um conjunto de pessoas que
fazem tudo em prol de outrem sem pedir nem exigir rigorosamente nada em troca.
A ARCO é provavelmente uma das
Associações Recreativas e Culturais mais activas do concelho de Fafe promovendo
actividades cujo público alvo vai desde os mais jovens aos idosos. É certo que
as pessoas residentes em Santo Ovídio são as que mais contactam e usufruem
destas actividades e portanto, haverá decerto muita gente que desconhece o
empenho das gentes que todos os anos organizam a festa do S. Brás, do Entrudo,
o Magusto, os cantares de Reis, o Festival Santo Rock, entre outras dezenas de
acontecimentos que animam a pacata localidade fafense. A verdade é que devia ser dado muito mais crédito a esta
Associação que, com as "armas" quem tem, vai lutando para manter
aceso o espírito altruísta pelo qual sempre vão pautando as suas actividades.
As pessoas deixam, por momentos, as suas vidas de lado para irem animar as
casas vizinhas com as cantigas dos Reis, acompanhadas pelos cavaquinhos, violas
e muita boa disposição. As pessoas despendem o seu tempo para organizar
anualmente um festival de Rock que já está enraizado no panorama musical do
concelho sendo um dos poucos a dar oportunidades a bandas fafenses e sendo, por
isso, um foco de concentração de jovens que lá se juntam para aceder ao evento
sem terem que pagar nada para lá entrar. As pessoas despendem o seu tempo para,
todos os anos, invariavelmente, embelezar a localidade com um presépio pelo
Natal , com o "pai das orelheiras"
pelo Carnaval e para organizar caminhadas e convívios.
A ADDAF é outra das Associações em
Fafe cujo empenho é louvável e está à vista de todos. Se percorrermos as redes
sociais e os jornais do concelho depressa nos aperceberemos que nesta
Associação só há uma coisa que excede em larga escala as suas óbvias
dificuldades - o seu amor pelos animais e o seu empenho em melhorar as suas
condições. Houve alguém que um dia disse que "a educação de um povo
mede-se pela maneira como este trata os animais" e que "quem não
consegue gostar de um animal dificilmente gostará de uma pessoa" - de
facto, os voluntários desta Associação têm um mérito enorme pela maneira como
trabalham em prol de seres que não têm maneira de sobreviver por não terem os
mesmos privilégios que os Humanos quando se trata de garantir o mínimo de
qualidade de vida. Paralelamente a isto, esta Associação também zela pela saúde
pública ao tratar dos animais, tirando-os das ruas e acolhendo-os, medicando-os,
algo que nem toda a gente se lembra quando passeia pela Arcada e se depara com
uma de muitas campanhas de adopção promovidas pela ADDAF e pelos seus voluntários.
Assim, é neste contexto de crise
profunda - uma crise que, como já vai sendo perceptível, ultrapassa a mera
recessão económica e nos leva para outras: a crise de confiança, a crise de
valores e a crise de solidariedade - que, ao analisarmos a actividade destas
Associações (e tantas outras) que funcionam à base do voluntariado, facilmente
percebemos que se tudo isto já era louvável há uns anos atrás, hoje é ainda
mais.
São estes exemplos que nos
proporcionam alguma abstração de todo este louco "carrossel" de
dificuldade em tempos difíceis. A propósito, Charles Dickens dizia "foi o
melhor dos tempos, foi o pior dos tempos".
Assim é. Nunca antes o trabalho realizado por estas associações me
pareceu tão nobre e por isso só tenho a agradecer e encorajar a continuarem o
seu trabalho. Obrigada.
A felicidade das pessoas e o amor
pelos animais não se medem em Euros. Acabar o dia com um sentimento
gratificante de que se fez algo em prol de alguém não se mede em Euros. Ter a
certeza de que se trabalha para deixar o mundo um bocadinho melhor recebendo
apenas essa sensação como retribuição não se mede em Euros.
Nem tudo se mede em Euros... e ainda bem.
Vanessa Barata
3 comentários:
Mais uma colaboradora que escreve bem e que tem boas ideias arranjaram. Força.
Excelente artigo!! Nos tempos que se vivem, dá-nos alguma "paz de alma" saber que, de facto, há coisas que não se medem em euros..
Parabéns!
É muito gratificante saber que o nosso trabalho é reconhecido, ainda nos dá mais vontade de fazer cada vez mais e melhor. obrigado
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