20 setembro 2012

A Austeridade e as Associações




Há pouco tempo lia um artigo de opinião numa conhecida revista informativa em que o seu autor declarava em tom depreciativo "hoje em dia, as coisas só se medem em euros".
De facto, empurrados pela conjuntura sócio-económica do nosso país, vivemos cada vez mais influenciados pelo valor material das coisas. Fazem-se contas à vida: há que pagar impostos, créditos, consumo. Há os subsídios disto e daquilo, dados de bandeja a uns, retirados inconstitucionalmente a outros. Há a troika, o governo, os chefes de Estado europeus e os media que nos enchem de informação sobre défices, juros da dívida,  bolsa de valores, austeridade e crise financeira. Tudo se resume, basicamente, a Euros.
No entanto, há ainda algumas coisas que nos fazem lembrar que nem tudo se resume a dinheiro e porque "o homem cresce na adversidade", há gente que continua a ter como objectivo o bem comum, independentemente dos euros que ganham (ou perdem) ao serem fieis a esse objectivo. Com estas dificuldades que se fazem sentir e num país onde cada vez mais o egocentrismo toma conta da sociedade, não por mera coincidência mas porque as circunstâncias assim parecem exigir que aconteça, faz ainda mais sentido reflectir sobre quem faz de si uma excepção à regra e decide pugnar por algo que não o benefício próprio.
No concelho de Fafe existem várias dezenas de associações recreativas, desportivas e culturais que são o espelho deste espírito altruísta. Não querendo desfazer nenhuma outra, há duas que gostava de mencionar - pela proximidade com as pessoas que dela fazem parte e pelo trabalho que realizam - a ARCO (Associação Recreativa e Cultural de Santo Ovídio) e a ADDAF (Associação de Defesa dos Direitos dos Animais e da Floresta) são duas associações que contrariam toda esta obsessão (legítima, mas não deixa de ser uma obsessão) pelos preciosos Euros. São um conjunto de pessoas que fazem tudo em prol de outrem sem pedir nem exigir rigorosamente nada em troca.
A ARCO é provavelmente uma das Associações Recreativas e Culturais mais activas do concelho de Fafe promovendo actividades cujo público alvo vai desde os mais jovens aos idosos. É certo que as pessoas residentes em Santo Ovídio são as que mais contactam e usufruem destas actividades e portanto, haverá decerto muita gente que desconhece o empenho das gentes que todos os anos organizam a festa do S. Brás, do Entrudo, o Magusto, os cantares de Reis, o Festival Santo Rock, entre outras dezenas de acontecimentos que animam a pacata localidade fafense. A verdade é que  devia ser dado muito mais crédito a esta Associação que, com as "armas" quem tem, vai lutando para manter aceso o espírito altruísta pelo qual sempre vão pautando as suas actividades. As pessoas deixam, por momentos, as suas vidas de lado para irem animar as casas vizinhas com as cantigas dos Reis, acompanhadas pelos cavaquinhos, violas e muita boa disposição. As pessoas despendem o seu tempo para organizar anualmente um festival de Rock que já está enraizado no panorama musical do concelho sendo um dos poucos a dar oportunidades a bandas fafenses e sendo, por isso, um foco de concentração de jovens que lá se juntam para aceder ao evento sem terem que pagar nada para lá entrar. As pessoas despendem o seu tempo para, todos os anos, invariavelmente, embelezar a localidade com um presépio pelo Natal , com o "pai das orelheiras"  pelo Carnaval e para organizar caminhadas e convívios.
A ADDAF é outra das Associações em Fafe cujo empenho é louvável e está à vista de todos. Se percorrermos as redes sociais e os jornais do concelho depressa nos aperceberemos que nesta Associação só há uma coisa que excede em larga escala as suas óbvias dificuldades - o seu amor pelos animais e o seu empenho em melhorar as suas condições. Houve alguém que um dia disse que "a educação de um povo mede-se pela maneira como este trata os animais" e que "quem não consegue gostar de um animal dificilmente gostará de uma pessoa" - de facto, os voluntários desta Associação têm um mérito enorme pela maneira como trabalham em prol de seres que não têm maneira de sobreviver por não terem os mesmos privilégios que os Humanos quando se trata de garantir o mínimo de qualidade de vida. Paralelamente a isto, esta Associação também zela pela saúde pública ao tratar dos animais, tirando-os das ruas e acolhendo-os, medicando-os, algo que nem toda a gente se lembra quando passeia pela Arcada e se depara com uma de muitas campanhas de adopção promovidas pela ADDAF e pelos seus voluntários.
Assim, é neste contexto de crise profunda - uma crise que, como já vai sendo perceptível, ultrapassa a mera recessão económica e nos leva para outras: a crise de confiança, a crise de valores e a crise de solidariedade - que, ao analisarmos a actividade destas Associações (e tantas outras) que funcionam à base do voluntariado, facilmente percebemos que se tudo isto já era louvável há uns anos atrás, hoje é ainda mais.
São estes exemplos que nos proporcionam alguma abstração de todo este louco "carrossel" de dificuldade em tempos difíceis. A propósito, Charles Dickens dizia "foi o melhor dos tempos, foi o pior dos tempos".  Assim é. Nunca antes o trabalho realizado por estas associações me pareceu tão nobre e por isso só tenho a agradecer e encorajar a continuarem o seu trabalho. Obrigada.
A felicidade das pessoas e o amor pelos animais não se medem em Euros. Acabar o dia com um sentimento gratificante de que se fez algo em prol de alguém não se mede em Euros. Ter a certeza de que se trabalha para deixar o mundo um bocadinho melhor recebendo apenas essa sensação como retribuição não se mede em Euros.
Nem tudo se mede em Euros... e ainda bem.


Vanessa Barata

3 comentários:

Anónimo disse...

Mais uma colaboradora que escreve bem e que tem boas ideias arranjaram. Força.

Sónia disse...

Excelente artigo!! Nos tempos que se vivem, dá-nos alguma "paz de alma" saber que, de facto, há coisas que não se medem em euros..
Parabéns!

ARCO disse...

É muito gratificante saber que o nosso trabalho é reconhecido, ainda nos dá mais vontade de fazer cada vez mais e melhor. obrigado