22 julho 2013

Fogachos Argumentativos



Ainda não tive oportunidade de apreciar os programas eleitorais das várias forças que irão concorrer à Câmara Municipal. Estou mais vocacionado para os fogachos argumentativas. Deles ressaltam três argumentos que me causam uma certa urticária: 

1.
És filho do teu pai, o teu pai fez isto ou aquilo. logo, vais fazer o mesmo que o teu pai.

É claro de ver que este argumento carece de efectiva legitimidade. Nele esconde-se uma outra premissa que no fundo vai ao encontro do provérbio popular «filho de peixe sabe nadar».

Em primeiro lugar, é muito subjectivo dizer que o «pai fez isto ou aquilo». Há certamente outros que dirão que o pai fez outras coisas. Em segundo lugar, é uma desconsideração pela liberdade individual colocar o peso do passado nos ombros de quem não participou. Numa redução ao absurdo, seria dizer que um filho de um assassino, assassino será, ou um filho de um estadista, estadista será. É, pois, um argumento falacioso sem ponta por onde se possa pegar...

2.
Não és de Fafe, não possuis conhecimento de causa. Portanto, não deves ser bom candidato.

Há relação entre ser ou não de Fafe e não poder ser bom candidato? Claro que não!
É certo e evidente que uma vivência quotidiana com a realidade poderá fornecer-nos um ponto de vista muito concreto e aproximado do modus vivendi de uma comunidade. Mas os cientistas sociais sabem que, quando procedem a uma investigação de campo de observador participante, a emoção pode manchar a objectividade. Acrescente-se ao facto desse argumento ser proveniente de muitos que dele usufruíram em diferentes circunstâncias, isto é, o feitiço vira-se facilmente contra o feiticeiro. É, pois, um argumento falacioso sem ponta por onde se possa pegar.

3. Todas as pessoas devem ter uma oportunidade. Está na hora dessa oportunidade. Logo, vamos dar a oportunidade ao candidato X.

É o argumento mais atractivo e, por isso, mais difícil de rebater. Contudo a primeira premissa não me parece correcta. O que é ter oportunidades? O conceito é entendido como a abertura de perspectivas quanto a um possível futuro. Ora, o futuro a maioria das vezes surge a partir daquilo que conscientemente promovemos, ou seja, a capacidade que cada um de nós tem de alterar o rumo natural das coisas. Daí que devemos substituir «Todos devem ter uma oportunidade» por «todos os que merecem devem ter uma oportunidade».
Sim, eu sei, o que é merecer? Quem merece? Pois, isto levar-nos-ia a principiologias e aí tinha que justificar as minhas tendências ideológicas...

É pois um argumento que tem alguma ponta por onde se possa pegar. Mas não serve por ter somente «alguma ponta».

António Daniel

1 comentário:

Miguel Summavielle disse...

1. Escuso-me a comentar, por razões óbvias, os legados familiares.
2. Quanto consideramos que o local de nascença de um candidato é um atributo determinante para a sua capacitação para o processo eleitoral autárquico, estamos, na minha opinião, a ser tacanhos.
Será que o Prof. Rui Adérito, o Prof. Carlos Afonso, o Dr. Jaime Silva, entre tantos outros, não foram ou são “Fafenses” de corpo e alma? Não reuniam ou reúnem condições para que os consideremos e respeitemos.
Acho que quem recorrer a esta linha de discurso não sustentará coisa alguma e esconde, quem sabe, a falta de melhores argumentos.
3. Quanto ao argumento das oportunidades, julgo que é uma deformação de discurso. Considero, inclusivamente, que deixa transparecer um certo miserabilismo.
As oportunidades surgem e quem tiver a vontade e a capacidade que as agarre.
Depois, é preciso trabalhar para merecer o voto dos outros. Mostrar ideias, projectos, opiniões, critérios e objectivos e deixar que a democracia funcione.
Pensar que se merece o voto só porque está na “nossa hora” é desconsiderar a capacidade de análise e decisão de quem nos elege.